Mais diálogo e menos práticas compulsórias para o telemarketing
* Por Elda Di Donato
Com a aprovação de uma nova lei paulista, em 10 de março de 2021, vale refletirmos sobre as políticas de telemarketing e suas consequências. Sancionada pelo governador de São Paulo, a Lei 17.334/2021, de autoria do deputado Jorge Caruso (MDB), atribui novo texto ao artigo 1º da Lei 13.226/2008, do mesmo autor, que estabelece a criação de um cadastro para bloqueio do recebimento de ligações de telemarketing.
A nova norma estadual visa aumentar os efeitos da lei antiga. Agora, além de não poder fazer ligações (inclusive, as automáticas ou robocalls), as empresas de telemarketing não poderão enviar mensagens por WhatsApp e SMS com finalidade comercial, ou qualquer tipo de cobrança, para os consumidores cadastrados para não receber chamadas no programa “Não me Ligue” do Procon-SP.
De acordo com o Procon-SP, encarregado da fiscalização, a regra vale para ligações ou mensagens feitas diretamente por funcionários da empresa, por terceiros contratados, por gravações ou qualquer outro meio.
É pertinente dizer que enxergo algumas contradições nessa nova lei. Por um lado, podemos pensar que a lei teria tudo para ser benéfica ao consumidor. Entendo que um dos objetivos da norma é eliminar uma prática excessiva de envio de mensagens com ofertas de produtos, serviços, e realização de cobranças – e concordo que algumas empresas extrapolam o aceitável.
O Brasil foi o campeão mundial de ligações indesejadas, pelo terceiro ano consecutivo, segundo levantamento da Truecaller, criadora de um aplicativo que identifica e bloqueia chamadas em celular e mensagens SMS, e tem 350 mil usuários ativos no Brasil e 270 milhões no mundo. Os usuários de linhas telefônicas no Brasil receberam, em média, 49,9 chamadas de spam por mês durante 2020. A média era de 45,6 em 2019 e de 37,5 em 2018.
Não se pode negar que o volume de mensagens aborrece o consumidor. Contudo, o teor e a natureza das ativações comerciais deveriam ser analisados e tratados de formas distintas, e não simplesmente se categorizar todas de forma simplista e restrita como “telemarketing”.
Além disso, os “serviços de cobrança” não deveriam ser categorizados como “telemarketing”. Existe uma diferenciação, ainda mais em um momento de crise econômica, agravada pela pandemia, em que a cobrança é considerada essencial para ajudar o brasileiro a negociar suas dívidas e manter o nome limpo, passível de obtenção de crédito novamente.
Olhando esses outros lados, analiso que existem serviços e ofertas benéficas às quais os consumidores não vão querer perder o acesso. Ao se colocar todos os serviços em um mesmo balaio, dificulta-se o relacionamento entre empresas e consumidores, e todos saem perdendo.
E, segundo a lei, são eles próprios, os consumidores, que detém o poder de decidir se querem ou não a oferta, e quais tipos de mensagens comerciais são indesejadas. É bem possível que o cliente queira receber ofertas de serviços de alguns setores e de outros não. E está tudo certo. Bastaria que ele pedisse o bloqueio do que não quer, e autorizasse uma ou mais empresas das quais deseja receber tais comunicações. E, claro, a central de relacionamento deveria retirar do sistema o cadastro daquele consumidor que não quer receber ofertas de seus produtos.
O bom senso e o respeito são sempre o melhor caminho. Quando penso sob a ótica das pequenas empresas, e dos comerciantes locais, fica o questionamento se eles não sairiam muito prejudicados pela nova lei, ainda mais agora que vivemos um momento de alta restrição de funcionamento dos estabelecimentos comerciais. E se o comerciante que precisou fechar sua loja física, e passou a se relacionar (ou oferecer produtos) com o consumidor por WhatsApp, for penalizado ou multado ao tentar oferecer os seus produtos aos clientes? Será justo?
As restrições à circulação e à concentração de pessoas tendem a inibir as demandas por diferentes serviços, o que pode contribuir ainda mais para a redução da atividade econômica, cujo vigor está diminuindo. Ainda falta muito diálogo para se chegar a um consenso que coopere para a boa convivência de todos, contribuindo para o avanço da regulamentação de um importante setor, que tanto contribui com o desenvolvimento do país.